sexta-feira, 23 de setembro de 2011

O dia da caça: ela avança, ele trava


Desde que Selma começou no novo emprego, Ricardo, seu colega na empresa, se aproximou dela. Durante todo um ano se insinuou, fazendo promessas veladas dos prazeres sexuais que poderiam desfrutar juntos. Ela levava na brincadeira, ria meio sem graça, porque na verdade não se sentia atraída por ele. Mas ele não desistia. Até que se tornou mais explícito e passou a insistir para que fossem a um motel. Não perdia a oportunidade de fazer uma piadinha e lançar olhares sedutores. Selma, então, decidiu resolver a questão de uma vez por todas. Um dia, mal ele chegou, foi até sua sala dizer que desejava, naquela tarde, conferir as delícias sexuais que há tanto tempo ele prometia. Pronto. Era tudo o que não podia acontecer. “Não entendi nada. Ele deu uma desculpa, disse que estava cheio de serviço e nunca mais falou direito comigo. Nos tornamos dois estranhos”.
Mulher tomar a iniciativa da proposta sexual? “Ah, não! Isso já é demais”, é o que ainda pensam muitos homens. Eles ficam assustados ao se imaginarem nessa situação. Sentem medo de dar um “branco” na hora, de não saber como agir nem o que dizer. E o pior: pode falhar a ereção. Afinal, o papel de conquistador é o único que o homem conhece, e fora dele não dá para se sentir à vontade. Desde menino ele foi treinando para isso, e, para complicar ainda mais, acreditou que faz parte da natureza masculina ser ativo – e da feminina a passividade. Mas é inegável que, apesar de tantos equívocos e limitações, ele antes vivia bem menos ansioso nessa área do que agora.

O papel que homem e mulher desempenhavam no sexo sempre teve regras claramente estabelecidas. Fazia parte do jogo de sedução e conquista o homem insistir na proposta sexual e a mulher recusar. Contudo, ele apostava no seu sucesso e para isso não media esforços. Quanto mais ela recusava, mais ele insistia e mais emocionante o jogo se tornava – só para ele, claro. Para a mulher era um tormento. Além de toda a culpa que carregava por estar permitindo intimidade a um homem, seu desejo era desconsiderado, assim como seu prazer. Como usufruir daquele encontro? Não podia relaxar um segundo. Ela sabia que, se não se controlasse, seria logo descartada e ainda por cima rotulada de fácil.
O papel de conquistador é o único que o homem conhece, e fora dele não dá para se sentir à vontade.
Mas o homem continuava insistindo, e ela dizendo não. Ele nem a percebia, o importante era chegar ao final. Jogo cruel para ambos, é verdade. Aprisionados à moral antissexual, nenhum dos dois tinha a menor chance de experimentar o prazer proporcionado pela troca de sensações eróticas. Se em algum momento a mulher cedesse, pronto. O homem se apaziguava com a confirmação da única coisa que buscava desde o início: se sentir competente e se afirmar como macho.

Entretanto, quando a mulher resistia às investidas, a autoestima dele não era abalada. Ele se apoiava na convicção de que o motivo da recusa se devia exclusivamente ao fato de ela ser uma mulher direita, de família. Assim, imune à preocupação de ter sido rejeitado por não agradar à parceira, continuava se sentindo poderoso e absoluto.

Toda essa encenação nos permite entender por que, até hoje, muitas mulheres se esquivam do sexo. Temendo ser usadas — e durante muito tempo foram mesmo —, se queixam com frases do tipo: “Os homens só querem sexo”, o que à primeira vista poderia soar estranho, já que ninguém duvida de que sexo é bom.
Agora as coisas mudaram. As mulheres dão sinais de não estarem nem um pouco dispostas a continuar se prestando a esse papel. Não querem apenas se mostrar belas e esperar passivamente que os homens se sintam atraídos e tomem a iniciativa. Isso está aos poucos se tornando coisa do passado. Mas como o homem vai resolver essa questão? Como vai se adaptar a essa nova realidade? O machão está em baixa, e a mulher busca homens que se relacionem com ela em nível de igualdade em tudo, também no sexo.
A situação do homem é bem complicada. Além de ser difícil de aceitar a igualdade com a mulher, o temor de ser avaliado e comparado a outros homens gera insegurança. Sem contar que outras preocupações, nunca antes sentidas, estão agora presentes o tempo todo: ter o pênis pequeno ou fino, a ejaculação precoce, não obter ereção no momento desejado, não proporcionar orgasmo à mulher. Muitos homens continuam procurando mulheres recatadas e passivas, acreditando estar assim mais garantidos. O problema é que em pouco tempo se sentem insatisfeitos.
Com a liberação dos costumes e todas as informações que são oferecidas, não dá mais para ignorar as muitas possibilidades de prazer sexual que um ser humano pode experimentar. Somente pessoas livres, que gostam de sexo e não têm preconceitos, estão em condições de compartilhar dessas descobertas com o parceiro.
Esses conflitos só vão ser resolvidos quando o sexo for aceito como algo bom, natural, que faz parte da vida. E não se precisar mais atribuir a ele motivos que não lhe são próprios.

Fonte:  http://delas.ig.com.br/colunistas/questoesdoamor/o+dia+da+caca+ela+avanca+ele+trava/c1597192846749.html

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